Aos trabalhadores
Levando pelo exemplo de algumas classes operárias associadas, o operariado de São Paulo está dando uma prova magnífica de vitalidade e energia.
O atual movimento em favor duma justa e necessária redução das horas de trabalho não obedeceu às ordens de nenhum chefe, não se centralizou em diretórios poderosos e obedecidos; tem o caráter que é próprio da ação da ação operária, é a obra dos próprios trabalhadores, consciente das suas necessidades e dos seus direitos.
A polícia, porém, não compreendeu assim. Julgou ameaçados os interesses e a autoridade dos patrões, dos ricos industriais, dos antigos escravocratas – dos seus senhores, enfim – e colocou-se ao lado deles, como costuma:
Para isso, serviu-se de miseráveis pretextos, como se quem tem a força e tão prepontemente abusa dela precisasse acaso de pretextos. Firmando-se em mal averiguados e insignificantes incidentes, esgravatando e interpretando retorcidamente confusos textos de lei, a polícia ataca o que ela pensa ser a cabeça, o centro propulsor do movimento grevista, e as prisões enchem-se de operários, muitas vezes apanhados ao acaso.
Para cumprir a lei – justificam seus servos na imprensa.
Cumprir a lei é assaltar a sede de uma associação operária, confiscar papéis e documentos, prender e espancar operários, pacificamente reunidos, fechar o local da Federação Operária, no próprio dia em que a Comissão Executiva aconselhava serenidade e o não fornecimento de pretextos à polícia provocadora.
Cumprir a lei é prender operários por “crimes” como se tem dado com alguns companheiros!
Cumprir a lei é impedir o livre e público exercício do direito de reunião, ou pela violência direta ou pela pressão exercida sobre os proprietários de salões.
Cumprir a lei é burlar a magistratura judicial, quando ela pede informação sobre os presos em cujo favor foi requerido hábeas-corpus; é mentir, dizendo que estão soltos, quando apenas os faz mudar de posto policial.
Oh, a lei não se cumpre, quando pode ser desfavorável aos patrões, aos que dispõem de dinheiro e de influência...Senão, quem sabe se a polícia não teria que fazer, espiando nos ergástulos industriais, onde falta a higiene e onde sobra tortura para mulheres e as crianças?
E que conseguiu a polícia com suas arbitrariedades contra os operários?
Cortou a cabeça da hidra? As greves continuam e o movimento alastra-se, sem desânimo, pelo Estado. Classes até hoje adormecidas ou inativas entraram a agir, com surpresa para todos, e as que nada fizeram ainda ou retrocederam ao primeiro passo devem esse mal à falta de confiança mútua que é dada pela associação, a sua inconsciência e desunião e não às vãs ameaças da polícia.
A polícia só conseguiu irritar os ânimos, ao passo que nós procuramos dar a serena consciência dum direito e duma situação.
A polícia só conseguiu derramar o fel amargo do ódio no coração dos oprimidos – ao passo que nos pedimos para todos justiça.
E conseguiu ao menos que nos calássemos? – Não.
Nós não somos chefes, não temos a ridícula pretensão de comandar. Não fazemos mais do que registrar e formular a reclamações que são comuns a todos nós operários: não fazemos mais que dar o exemplo, quando é possível, na defesa de interesses que são também vossos, não fazemos mais do que reunir, na pequena parte em que isso é possível, os esforços solidários de todos os conscientes.
Não podemos dar ordens – nem queremos também dar pérfidos conselhos de resignação, atraiçoando a nossa classe e a nossa própria dignidade de trabalhadores.
Em vez de dizermos aos nossos companheiros: “Aceitai as imposições dos patrões e as arbitrariedades da polícia; abdicai dos vossos direitos; submetei-vos a um jogo sempre mais pesado sem protesto; afogai na vossa passividade o nosso próprio sentimento de revolta” - nos dissemos...
TRABALHADORES!
Agora que vossos companheiros abrem resolutamente o caminho das reivindicações, imitai o forte exemplo, procurai melhorar a vossa situação – menos horas de fadiga, mais descanso, isto é, menos necessidade de álcool para chicotear os nervos num trabalho brutal, mais alegria no lar, mais pão para a boca, mais instrução para vós, mais bem-estar para a educação para os filhos!
Não deis foca aos vossos inimigos de classe - que tão hipocritamente falam em “liberdade de trabalho” – traindo os vossos companheiros em luta, rompendo a sua solidariedade, forçando-os com a vossa traição a voltar ao mesmo jugo.
TRABALHADORES!
Os patrões e a polícia empregam contra vós a violência, a arbitrariedade, o engano, a mentira na imprensa, os sofismas, os manejos jesuíticos que desconcertam e intimidam, mas não desanimeis.
Além do direito, tendes também a forca- que é força do vosso braço indispensável, e da vossa união.
A união dá a confiança mútua e a coragem: associai-vos e agi!
VIVA A SOLIDARIEDADE OPERÁRIA !
São Paulo, 24 de maio de 1907.
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